Pode Crê

Viver Sem Pressa

Clecio Almeida Season 1 Episode 26

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Já notou como a pressa virou regra e o silêncio virou ameaça? Partimos de relatos reais de esgotamento após a conquista para investigar por que o “agora” seduz, vicia e cobra um preço alto da saúde mental. Conversamos sobre como a cultura do time is money molda hábitos, por que reforçar só o pensamento rápido enfraquece a reflexão e de que forma micro-recompensas digitais treinam a impaciência até na fila do café.

Trazemos a lente de Daniel Kahneman para entender os sistemas do cérebro e conectamos com pesquisas sobre dopamina e condicionamento: estímulos imediatos prometem prazer, mas entregam dependência, ansiedade e apatia. Discutimos o desconforto com o silêncio, da sala de concerto a um estádio quase mudo, e como pausas conscientes revelam cansaços, perguntas e alegrias adiadas. Em vez de demonizar tecnologia, propomos recuperar presença com escolhas simples: uma tarefa de cada vez, limites para notificações, rituais de descanso e espaços sem tela para ouvir o corpo e a mente.

Também revisitamos ideias de sentido e propósito, lembrando que viver só por metas cria o vazio pós-conquista. Quando tudo é urgente, nada é profundo; e sem profundidade, não há estabilidade emocional. O convite é trocar velocidade por presença, redefinir prioridades e adotar um ritmo que não destrua por dentro. Se você sente culpa ao descansar ou acha que está sempre atrasado, essa conversa oferece linguagem, ferramentas e coragem para desacelerar com intenção.

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SPEAKER_00:

Olá, tudo bem pessoal? Sejam bem-vindos e bem-vindas a mais um episódio do seu podcast, o Podcast Pode Crer. Vivemos na era da resposta rápida, da entrega expressa, do conteúdo de 15 segundos, da ansiedade disfarçada de produtividade, e quase ninguém está falando do preço emocional que estamos pagando por isso. Hoje eu quero conversar com você sobre imediatismo, não como conceito abstrato, mas como um estilo de vida que está adoecendo nossa saúde mental. Esse episódio, claro, não é para acusar ninguém, é para nos despertar. Vamos refletir? Aqui, no seu podcast, Pode Crer. Eu estava conversando com uma pessoa. Ela pode morar aqui ou no Brasil, não importa. Prefiro preservar ao máximo sua identidade. Em determinado momento, ela me disse algo que ficou ecuando dentro de mim. Ela disse, Minha saúde mental não está bem. Eu percebo isso porque não tenho forças para trabalhar, estudar, sair e nem mesmo para fazer minha atividade predileta. Algo que antes ocupava parte do meu dia me trazia muita satisfação, hoje não tenho prazer nenhum. Hoje, na verdade, se tornou um peso. Perguntei quando esse sentimento havia começado e se havia algum gatilho para essa frustração. A resposta foi profunda e, ao mesmo tempo, assustadoramente comum. Ela me disse que tudo começou com algo que desejava muito. Foram anos tentando, insistindo, correndo, sonhando, até que finalmente conseguiu. E quando conseguiu, veio o vazio. Sentia-se sem meta, sem busca, sem pressa, sem alvo, sem objetivo. A sensação era de uma alma esgotada, sem propósito. Nós oramos e essa pessoa está buscando ajuda profissional, o que por si só já é um passo de coragem. Esse relato eco é exatamente o que Victor Frank descreve em seu livro Em Busca do Sentido. O vazio existencial surge quando o ser humano vive apenas para alcançar algo e não para se tornar alguém. Estamos vivendo tempos difíceis para a saúde mental. Vivemos na era do imediatismo institucionalizado, onde tudo precisa ser rápido, produtivo e mensurável. Recentemente estive no Brasil com minha esposa e resolvemos tomar um café em uma loja chamada Balduco. No cardápio havia um café gourmet com Nutella na borda do copo e um biscoito que eu nem sabia exatamente o que era, mas que me despertou imediatamente o paladar. Fiz o pedido, paguei e fiquei em pé aguardando. Após alguns segundos, a atendente me olhou e disse: Pode se sentar, levamos até você. Havia apenas eu e minha esposa na loja. Ainda assim o café levou cerca de dez minutos para chegar até a nossa mesa. Automaticamente fiz a comparação com os Estados Unidos. Aqui fazemos o pedido no caixa e a pessoa que prepara o café já escuta tudo. Não dá tempo nem de sentar. Em menos de dois minutos está tudo pronto. Por muito tempo achei que isso fosse uma grande qualidade no atendimento, um diferencial positivo, até entender que isso não é apenas eficiência, é cultura. A cultura do time is money. Quando não vigiamos, o imediatismo nos engole. Começamos a viver no automático, reagindo a estímulos como ratinhos de laboratório correndo atrás da próxima recompensa. E quando alcançamos, corremos o risco do vazio. E sim, isso impacta diretamente a nossa saúde mental. Por isso precisamos desacelerar, refletir e, acima de tudo, cuidar de nós mesmos. Porque nem tudo que é rápido é saudável, e nem todo silêncio é perda de tempo. Às vezes é exatamente nele que a alma volta a respirar. Imediatismo é a expectativa constante de que tudo deve acontecer agora. Agora eu quero resposta. Agora eu quero resultado. Agora eu quero alívio. O problema é que o cérebro humano não foi projetado para viver em urgência permanente. No livro Rápido devagar de Daniel Kahneman, explica que o nosso cérebro tem dois sistemas: um rápido, impulsivo e emocional, e o outro lento, reflexivo, profundo. O imediatismo fortalece o sistema rápido e atrofia o lento. E uma mente que não consegue desacelerar, não consegue se sustentar emocionalmente. O imediatismo nos ensina a correr atrás das metas, mas não nos ensina a habitar o processo. E quando o processo acaba, sobra o silêncio, e nem todo mundo sabe lidar com ele. No livro Nação Dopamina, da psiquiatra Ana Lemke, explica que o nosso cérebro se adapta rapidamente ao prazer imediato. Quanto mais estímulos rápidos, mais precisamos deles para sentir algo, curtidas, mensagens, compras, notificações. Tudo vira uma pequena dose de alívio. O problema é que o cérebro cobra depois, e ele cobra em forma de ansiedade, irritabilidade, apatia e exaustão emocional. O imediatismo promete prazer, mas entrega dependência. Deixa eu te provar que você já foi contaminado pelo vírus do imediatismo. Quando você coloca algo no micro-ondas, quantas vezes você abre a porta antes do tempo terminar? Mesmo sabendo que a comida ainda não está quente o suficiente, você confere, fecha, espera mais alguns segundos, abre de novo, é quase automático. A gente não sai mais do carro para pegar um café, passa no drive-thru. Deseja tudo sem sair do lugar, sem esperar, sem pausa. Quando compramos algo na Amazon, escolhemos a entrega para o dia seguinte, mesmo quando aquilo não é tão urgente, mesmo quando poderíamos esperar tranquilamente mais alguns dias. Mas só a ideia de esperar incomoda. O problema não é o micro-ondas, não é o drive-thru, nem entrega rápida. O problema é que isso está treinando dentro de nós uma mente que não tolera espera, um coração que confunde urgência com necessidade. E quando esperar se torna insuportável, algo muito maior do que o tempo já foi afetado. Pesquisas citadas em O Poder do Hábito, de Charles Deigg, mostram que estímulos imediatos condicionam o comportamento. Assim como ratinhos apertando uma alavanca esperando recompensa. Nós repetimos ações esperando alívio instantâneo. Rolamos a tela, abrimos o aplicativo, compramos algo sem mesmo precisar. Não porque queremos, mas porque fomos condicionados. E isso cansa a alma. Ansiedade é muitas vezes uma mente vivendo o futuro. Depressão é muitas vezes uma mente sem sentido no presente. O imediatismo alimenta os dois. Segundo o American Psychological Association, a exposição constante a estímulos rápidos está associada ao aumento de estresse crônico e dificuldade de regulação emocional. Quando tudo é urgente, nada é profundo. E sem profundidade não há estabilidade emocional. Uma outra pessoa me disse, eu não sei mais descansar. Quando paro, me sinto culpado, me sinto culpada. Parece que estou atrasado na vida. Descanso virou luxo. Silêncio virou ameaça. Mas a mente precisa de pausa para se curar. Quando eu estudava música lá no Vila Lobos, no Rio de Janeiro, havia uma professora que repetia constantemente uma frase que marcou a minha formação. Ela dizia, silêncio também é música. Ela não dizia isso apenas como teoria, ela nos provou na prática. Um dia ela nos apresentou uma obra de John Cade, chamada de silêncio de 4 minutos e 33 segundos. Sim, isso mesmo que você ouviu. Um silêncio de mais de 4 minutos. Em uma apresentação, o músico se senta ao piano e não toca absolutamente nada durante 4 minutos e 33 segundos, você pode encontrar esse vídeo lá no YouTube. A pessoa se posiciona ao piano, o público aguarda e nada acontece. Nenhuma nota, nenhum acorde, apenas silêncio. E ele é constrangedor, inquietante, desconfortável. Quando termina os eternos 4 minutos e 33 segundos, o pianista recebe as palmas se curvando diante de uma plateia sem pudor absolutamente nenhum. Não à toa, esse vídeo acumula milhões de visualizações. Os pianistas dizem que é a música mais fácil de se tocar no piano. Mas eu, particularmente, discordo, porque você se paramentar e, diante de uma audiência, sentar-se ao piano e não tocar nada por 4 minutos e 33 segundos em um silêncio ensurdecedor exige muita coragem. Algo interessante aconteceu recentemente quando o Flamengo foi jogar lá no Catar. O Flamengo tem a maior torcida do Brasil, onde joga costuma transformar qualquer estádio em sua casa. Mas ali foi diferente. Havia menos de 10 mil pessoas nas arquibancadas. Pouco barulho, pouca reação, muito silêncio. E os jogadores estranharam, sentiram falta do som, do grito, da pressão, da energia, se sentiram incomodados com o silêncio gritante. Porque o silêncio revela, ele tira distrações, ele nos confronta com nós mesmos. A verdade é simples e incômoda. Nós não suportamos o silêncio. Talvez o nosso incômodo com o silêncio diga mais sobre o nosso mundo interior do que sobre a ausência de som. Resistir a esse imediatismo não é fugir da tecnologia, por exemplo. É aprender a esperar, fazer uma coisa de cada vez estar presente. No livro Essencialismo de Craig McCain afirma, se você não priorizar a sua vida, alguém fará isso por você. Desacelere, porque isso é um ato de coragem. Talvez o que esteja faltando na sua vida, na minha vida, não seja mais velocidade, seja mais presença. Talvez o que você chama de atraso, ou eu chamo de atraso, na verdade, é o ritmo certo para a sua alma. O imediatismo promete controle, mas rouba sentido. A espera quando o consciente devolve profundidade. Inspira mais uma vez, você não precisa correr para existir. Eu não preciso correr para existir. Eu preciso viver no tempo certo. Salomão foi o homem mais sábio que já existiu sobre a Terra. Ele disse algo profundo, lá no livro de Eclesiastes. Ele disse, tudo tem seu tempo. A gente acelera muito na vida e a gente tenta preencher cada espaço vazio com som, com tela, com conversa, com tarefa. Não para ganhar tempo, mas para não sentir o silêncio. O silêncio não é ausência, o silêncio é revelação. Ele mostra o cansaço que você vem ignorando, mostra a tristeza que você não nomeou, mostra a alegria que você adiou, mostra a pergunta que você vem evitando, se o jeito que você está vivendo está te fazendo bem ou não. E essa pergunta assusta, porque ela não pede resposta rápida, ela pede coragem. Vivemos como se tudo fosse urgente, mas poucas coisas são realmente essenciais. E, no fundo, talvez o que mais esteja faltando não seja tempo, mas seja presença. Presença para estar inteiro em uma conversa, presença para saborear um café sem pressa, presença para perceber que o corpo está cansado antes de adoecer. Presença para entender que você não é uma máquina, você é humano. Se você sair desse episódio levando apenas uma coisa que seja essa: desacelerar não é perder tempo, é escolher. Escolher viver com mais sentido. Escolher ouvir a própria alma. Escolher um ritmo que não te destrua por dentro. Daqui a pouco o mundo vai te chamar de novo, as notificações vão piscar, as cobranças vão voltar, a pressa vai tentar te convencer de que você está atrasado. Mas lembra disso, você não precisa correr para ser valioso. Você não precisa produzir para merecer existir. Você não precisa preencher todos os silêncios. Às vezes é justamente no silêncio que a vida finalmente consegue falar. Obrigado por estar aqui comigo. Esse foi o episódio número 26. Imagina isso. Episódio 26. Graças a Deus e a você que me dá o privilégio em me ouvir semanalmente. Obrigado por se permitir esse tempo. A gente se encontra no próximo episódio, se Deus assim permitir. Lembre-se do que disse Salomão: há tempo para tudo. Esse foi o episódio sobre imediatismo aqui no seu podcast. Pode crer.

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